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País esteve à beira da guerra civil em 2006 - Ramos-Horta

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Díli, 19 nov (Lusa) - Timor-Leste esteve à beira da guerra civil em 2006, por um conflito que começou em 2000, entre o CNRT e a Fretilin, e que foi crescendo porque a liderança timorense não soube dialogar, disse à Lusa José Ramos-Horta.

"Esteve sim à beira da guerra civil. O grande desafio para nós, na altura, para mim e intervim nesse sentido insistentemente, era para evitar que o conflito de Díli desembocasse numa guerra civil para fora de Díli", disse em entrevista à Lusa o ex-Presidente timorense, referindo-se ao conflito iniciado em 2000 entre o Conselho Nacional da Resistência Timorense (CNRT) e a Frente do Timor-Leste Independente (Fretilin).

"Isso envolveu muito diálogo com os peticionários (soldados), para evitar que alinhassem com o Alfredo Reinado. Fiz esse diálogo e consegui. Apenas um pequeno grupo, não mais de 20 seguiu o Reinado. Os outros recusaram", sublinha.

Alfredo Reinado, ex-comandante da Polícia Militar, foi um dos protagonistas de crise político-militar de 2006, quando fugiu para as montanhas, em desafio à hierarquia das Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL).

Os contornos exatos do que ocorreu em 2006 continuam por ser detalhados, com vários dos intervenientes a permanecerem calados sobre muitos dos aspetos do que ocorreu ou a remeterem para mais tarde as suas declarações.

Uma complexidade que envolveu manifestações lideradas pelo bispo de Díli contra a intenção do Governo não tornar a religião e moral obrigatória na escola, uma movimentação política forte contra o executivo liderado por Mari Alkatiri e conflitos e tensão no seio das forças de defesa (F-FDTL) e entre estas e a polícia (PNTL).

Um barril de pólvora onde se intensificou um conflito mais antigo, entre o então Presidente Xanana Gusmão e Mari Alkatiri e que ficou marcado pela deserção de Alfredo Reinado e a sua aproximação a Gastão Salsinha, ex-tenente das F-FDTL, que também entrou em choque com a hierarquia militar.

Intervenções amplamente criticadas do então embaixador dos Estados Unidos em Díli e do núncio em Jacarta, intensificaram a situação que culminou na demissão de Alkatiri, na nomeação de Ramos-Horta como primeiro-ministro, na prisão do ministro do Interior Rogério Lobato, acusado de armar civis e em violentos confrontos em Díli.

Timor-Leste teve que pedir apoio internacional, regressaram tropas australianas e efetivos da Guarda Nacional Republicana, de Portugal, e dezenas de milhares de pessoas foram obrigadas a refugiarem-se em acampamentos temporários.

Nos bastidores de tudo, explica Ramos-Horta, está um conflito que começou em 2000, entre a Fretilin e o CNRT que se materializou no primeiro congresso, no ginásio de Díli, em que a Fretilin tentou impedir que Xanana Gusmão e Ramos-Horta falassem.

"Alguém do CNRT exigiu que falássemos e a Fretilin pediu voto. Apenas 18 de 400 delegados votaram contra falarmos", disse, explicando que o encontro "revelou grande rivalidade da liderança CNRT-Fretilin, Xanana Gusmão-Mari.

"Aí foi a nossa falha não termos reconhecido com humildade, simplicidade, camaradagem, como companheiros de luta, que devíamos sentar e conversar", reconhece.

A situação agudizou-se com as eleições de 2001, que a Fretilin ganha com maioria e em que "impõe um sistema político através da Constituição", com a qual Ramos-Horta concorda, mas "que relegou o Presidente da República, Xanana Gusmão, para um papel bastante atenuado, cerimonial".

"Obviamente alguém como Xanana Gusmão que tendo dirigido com sucesso toda a nossa resistência depois do 'debacle' da morte de Nicolau (Lobato, primeiro Presidente timorense, em 1975), seria um PR executivo. Isso não aconteceu", afirmou.

Horta rejeita que as culpas possam ser atribuídas às Nações Unidas considerando que mais do que o processo de criação das FDTL e PNTL "o problema foi no pós-independência" com "a má gestão nas forças armadas", alegações de discriminação e outras questões administrativas "que teriam sido evitadas".

Timor-Leste, recorda, não tinha meios, começou a sua vida com um primeiro orçamento de apenas 68 milhões de dólares, insuficiente "para dar satisfação às expetativas" e, novamente, sem o necessário diálogo permanente e constante entre os líderes.

"Viu-se isso em 2006. A presença das forças internacionais foi importante para garantir a segurança mas uma operação militar não resolve um problema social, político de fundo. Ai são necessários os líderes. E quando voltámos ao terreno, começámos a dialogar e eles ouviram", insiste.

ASP // EL

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