Macau, China, 15 mai (Lusa) -- Mais de 3.000 pessoas, segundo os organizadores, e 1.100, de acordo com a polícia, saíram hoje à rua para pedir a demissão do chefe do Governo de Macau devido a um controverso donativo a uma universidade da China.
O protesto, sob o 'slogan' de três R ("Refund, Resign e Reform", "Reembolso, Resignação e Reforma), foi convocado pela Novo Macau, a maior associação pró-democracia e segue-se a uma petição lançada 'online', contra a atribuição, através da Fundação Macau, de um apoio de 100 milhões de yuan (13,5 milhões de euros) à Universidade de Jinan.
A Novo Macau entende haver "conflito de interesses" por o chefe do executivo, Fernando Chui Sai On, presidir ao Conselho de Curadores da Fundação Macau e ser, em simultâneo, vice-presidente do Conselho Geral da Universidade de Jinan.
O protesto, participado sobretudo por jovens, que teve início às 15:00 (08:00 em Lisboa) no Jardim Vasco da Gama, durou pouco mais de três horas, e decorreu de forma pacífica.
Na frente seguia uma imagem do rosto de Chui Sai On, com um 'carimbo' vermelho na testa com o número 380 -- o número de votos com que conquistou a reeleição, em 2014.
Para Ng Kuok Cheong, deputado e um dos fundadores da Novo Macau, existe conflito de interesses e um problema que radica na própria Fundação Macau. "Se o sistema realmente permite que qualquer pessoa deixe de estar em conflito de interesses por não receber salário então isto é um problema muito significativo para Macau porque mostra que o próprio sistema está errado".
"Este caso que acontece atualmente demonstra muito claramente que a Fundação Macau não tem legitimidade para lidar com tanto dinheiro (...). Os residentes não acreditam nesta fundação, não têm confiança nela", sublinhou.
Ng Kuok Cheong indicou que irá propor um mecanismo, como um "debate aberto na Assembleia Legislativa", onde sejam tomadas decisões sobre a atribuição de fundos para fora de Macau.
Leng, de 29 anos, foi uma das jovens que participou no protesto não por estar contra o donativo 'per si', mas antes contra a "falta de transparência", defendendo que tratando-se de erário público a decisão não deveria ser comunicada apenas quando foi já tomada.
Outras três jovens, incluindo duas estudantes e uma trabalhadora, decidiram juntar-se por não apoiar o donativo, defendendo que os fundos públicos deviam ser usados em prol da população de Macau.
Isabel Neves, outra participante, juntou vários argumentos: "Esse montante que foi doado não percorreu os caminhos corretos (...). Um montante tão grande devia passar através da Assembleia para eles autorizarem. Esse dinheiro pertence à população de Macau".
Os manifestantes ainda estiveram parados durante uns minutos na avenida onde se localiza a sede do Governo, que vai dar à Assembleia Legislativa, uma vez que a rua foi bloqueada pela polícia.
O bloqueio da polícia surgiu em cumprimento de uma decisão do Tribunal de Última Instância, que não permitiu que os manifestantes seguissem pela estrada, pelo que a reta final do percurso foi feita pelo passeio, terminando sob uma larga tenda que existe entre o Governo e a Assembleia Legislativa.
Dezenas de manifestantes seguiram ainda o presidente da Novo Macau, Scott Chiang, até à Colina da Penha, para deixar na caixa do correio da residência oficial do chefe do Executivo uma carta com as reivindicações, mas depararam-se com a estrada cortada.
A manifestação terminou com os participantes a transformarem as reivindicações impressas em pequenos aviões de papel que foram lançados, por cima do muro, para o interior de Santa Sancha.
O presidente da Novo Macau, Scott Chiang, prometeu que as iniciativas não vão parar enquanto não forem cumpridos os "três R".
"Não acabou, é realmente um verdadeiro início: Não é todos os dias que uma multidão de tão grande tamanho aparece. É uma mensagem forte o suficiente para o chefe do executivo e para aqueles que estão no poder no sentido de que o 'pork-barrel' [clientelismo] tem de parar já", concluiu.
O protesto de hoje foi o maior desde o realizado em maio de 2014, contra uma proposta de lei que previa regalias para os titulares dos principais cargos da região a aguardar posse, em efetividade e após cessação de funções.
A manifestação, que levou o Governo a retirar o diploma, juntou entre 10.000 e 15.000 pessoas segundo a organização e 8.000 de acordo com a polícia e foi a maior desde 1999, quando a administração de Macau passou de Portugal para a China.
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