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“A AUSTRÁLIA NÃO DEVE ROUBAR O FUTURO A TIMOR-LESTE”, diz movimento cívico

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Durante a visita do governador-geral da Austrália, o general Peter Cosgrove, a Timor-Leste (02 e 03 de março), o Movimento contra a Ocupação do Mar de Timor (Movimentu Kontra Okupasaun Tasi Timor – MKOTT) viu rejeitado um pedido para se encontrar com aquele representante da coroa britânica na Austrália. A intenção do movimento seria entregar uma carta aberta a pedir a Cosgrove que intervenha junto do Governo australiano para que recomece as negociações de definição da fronteira marítima entre o seu país e Timor-Leste.

De acordo com a embaixada australiana em Dili, a agenda da visita de dois dias do General Cosgrove a Timor era muito apertada, não havendo possibilidade para receber os representantes do movimento. Na carta, escrita em Tétum, o MKOTT sublinha que Timor-Leste continua a ser um país “explorado” apesar da independência obtida sobre a Indonésia em 2002:

“Apesar de Timor-Leste ter conquistado a independência, infelizmente, a exploração e a ocupação continuam. Timor-Leste continua ocupado, mas agora pelo Governo da Austrália, situação que nos desilude e entristece, o país do qual você é governador-geral, um país rico e próspero.”

A importância deste pedido a Peter Cosgrove? 

Cosgrove é um oficial militar australiano reformado que serviu o seu país na guerra do Vietname. Foi chefe-maior das forças armadas e de defesa entre 2000 e 2005 mas antes comandou a INTERFET, uma força multinacional liderada pela Austrália que foi estabelecida em 1999 para implementar a segurança e a paz em Timor-Leste. Por essa razão, o general Cosgrove visitou a capital Díli para receber a mais alta condecoração do país para estrangeiros, o grande colar da Ordem de Timor-Leste. Sendo um “amigo” de Timor, o MKOTT entendeu pedir ao atual governador-geral que pressione o seu Governo a voltar à mesa das negociações:

“Por esse motivo, através desta carta, o MKOTT quer aproveitar a ocasião da sua visita para apelar a si, um amigo histórico do povo de Timor-Leste, para usar a sua influência e pedir ao Governo australiano que: 1) Respeite a soberania e a dignidade do povo e da nação de Timor-Leste tal como fizeram com outras nações. 2) Respeite os mecanismos de resolução de fronteira marítima de acordo com a jurisdição do Tribunal Internacional de Justiça e da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. 3) Se concentre na negociação “franca e aberta” da fronteira marítima e não se foque em outras negociações bilaterais e gerais entres os dois países. 4) Pare com o argumento “Plataforma continental” porque já não é válido. 5) Pare de exercer a sua pressão politica e económica que está a roubar a riqueza de Timor-Leste e o futuro do seu povo.”

O Movimento contra a Ocupação do Mar de Timor (MKOTT) é um movimento social composto por ativistas, estudantes, ex-combatentes, individualidades e por organizações da sociedade civil timorense. Desde a sua criação, em 2004, este movimento tem zelado para que os governos da Austrália e de Timor-Leste encontrem vias legais e diplomáticas para estabelecer as fronteiras marítimas entre os dois países da forma que seja mais justa, para ambas as partes. O impasse sobre o estabelecimento de uma fronteira marítima entre Timor-Leste e a Austrália tem sido longo e envolto de situações polémicas.

Espionagem ao estilo “Watergate”

Em 2013, o Governo australiano foi acusado de interferência no “acesso aos recursos e soberania de Timor-Leste”. A Austrália terá obtido de forma ilícita informação confidencial sobre petróleo e gás no Mar de Timor, tendo “prejudicado os timorenses durante as negociações para o Tratado sobre Determinados Ajustes Marítimos no Mar de Timor (CMATS) em 2004”. Segundo relatos, espiões australianos terão colocado escutas dentro do palácio do Governo e tirado vantagem na negociações, com essas escutas:

“O ministro do Petróleo e Recursos Minerais, Alfredo Pires juntamente com o advogado Bernard Collaery alegam que os Serviços Secretos de Inteligência Australianos – ASIS, quebraram a barreira da soberania timorense e da Lei Internacional durante as negociações sobre as reservas de gás natural existentes na região do ‘Greater Sunrise‘ [cujas receitas estimadas rondam os 40 mil milhões de dólares americanos] numa ‘conspiração criminosa engendrada a partir de Camberra’. (…) Tratou-se de um caso Watergate. Eles entraram nos gabinetes oficiais do primeiro-ministro (Mari) Alkatiri e do seu governo sem autorização e, clandestinamente, colocaram as escutas.”

Esta ação, levada a cabo pelos serviços de inteligência australianos, terá contornos ainda mais “perturbadores” se se comprovar as alegações de que as “escutas foram introduzidas através de um plano de ajuda para a remodelação do Palácio do Governo disfarçado num projeto da AusAid“, a agência governamental australiana para a cooperação internacional. O professor e investigador de Politica da Universidade Swinburne, em Melbourne, Michael Leach refere que:

“A hipótese de que a AusAid terá sido usada, sem o seu próprio conhecimento, em atividades de recolha de informação é bastante perturbadora e levanta preocupações quanto à sua atividade, na região, sobre se está livre ou não de suspeita durante as suas funções. O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, Alexander Downer, desvalorizou as alegações classificando-as de “noticias antigas”, no entanto, o seu papel atual como consultor para a empresa de Petróleo Australiana Woodside deixa pouca confiança nas suas palavras.”

A exploração do “Greater Sunrise”, no Mar de Timor

“Todas as reservas de petróleo e gás estão do lado timorense da linha mediana, ou seja, mais perto de Timor-Leste do que da Austrália.”

A “ganância” pela exploração dos recursos de Timor-Leste data de 1963 quando o “Governo australiano emitiu uma licença de exploração de petróleo à Woodside Petroleum”, a empresa que tem explorado os recursos minerais do Mar de Timor. Em 1972, a Austrália celebra um acordo “bastante favorável” com o regime indonésio do Presidente Suharto que lhe valeu uma “fronteira marítima mais alargada e mais próxima da Indonésia” obtendo assim o acesso a mais recursos minerais. Acordo que Portugal recusou:

“Portugal – na altura a potência colonial administradora de Timor-Leste – recusou participar nas negociações, tendo optado por aguardar pelo processo internacional que, em 1982, resultou na Convenção da ONU sobre o Direito do Mar ou UNCLOS (sigla em Inglês). A decisão de Portugal deixou um “buraco” na fronteira australo-indonésia dando origem ao ‘Timor Gap’.”

De 1989 a 1999 a Austrália explorou os recursos minerais de Timor-Leste de forma “ilegal ao reconhecer unilateralmente a integração ‘de facto’ do território na Indonésia e fechando os olhos às atrocidades e crimes cometidos contra os direitos humanos”, refere um artigo publicado no Global Voices, pela investigadora sobre Timor-Leste, Marisa Gonçalves.

A Austrália e a Indonésia celebraram, em 1989, um “acordo de cooperação na base 50/50″ de exploração dos recursos minerais do Timor Gap, acordo que Portugal também “rejeitou mas cuja oposição não obteve sentido prático pois a Indonésia não reconhecia a autoridade judicial Internacional”, refere ainda Michael Leach.

A Austrália está a aproveitar-se das fraquezas de Timor-Leste

“A Austrália tirou proveito das fraquezas de Timor-Leste e está agora a ludibriar as suas obrigações internacionais perante a definição da fronteira marítima.”

A declaração é do deputado timorense do CNRT, Natalino dos Santos Nascimento, dada à agência de notícias australiana (AAP), durante a visita de Peter Cosgrove e publicada na página de um dos serviços de televisão pública, a SBS. O deputado refere-se à ação do Governo australiano em 2002.

Em março desse mesmo ano, o Governo australiano deixou de reconhecer a jurisdição do Tribunal Internacional de Justiça para as fronteiras marítimas:

“A Austrália abandonou o mecanismo de resolução de disputas de fronteira marítima da Convenção das Nações Unidas sobre a Lei do Mar (UNCLOS) e deixou de reconhecer a jurisdição do Tribunal Internacional de Justiça, dois meses antes da restauração da independência de Timor-Leste em maio de 2002. Estas ações unilaterais, que demonstram fraca confiança no argumento da ‘plataforma continental’, deixaram Timor-Leste sem a opção de recorrer à arbitragem internacional. A saída da Convenção foi feita em segredo, o parlamento australiano apenas teve conhecimento quando a ação teve efeito.”

Atualmente, a nação de Timor-Leste, independente desde 2002, exige que a Austrália reconheça a jurisdição do Tribunal Internacional de Justiça e da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar e que estabeleça a sua fronteira na linha mediana entre os dois países, como refere a lei internacional. Em causa estão as reservas de petróleo e gás natural existentes na região do “Greater Sunrise” que estão situadas do lado de Timor-Leste.

Até ao momento, o Governo da Austrália não tem mostrado disponibilidade para abrir mão destes recursos, no valor de 40 mil milhões de dólares, e voltar à mesa das negociações, apesar dos apelos por parte das autoridades timorenses.

[Atualizado, 10.03.15] Contudo o partido da oposição pensa o contrário, a porta-voz do Partido Trabalhista australiano (Labor), Tanya Plibersek, sublinha que “o seu partido considera reverter a posição da Austrália face à UNCLOS e que no caso de Timor-Leste está preparado para submeter-se à arbitrariedade de Haia se as conversações de ‘boa fé’ entre os dois estados falharem” e acrescenta:

“A Austrália pede regularmente aos outros países que se rejam pela lei internacional e que sigam a mesma norma nas suas disputas. Se queremos que as outras nações cumpram as regras do jogo, então nós também temos de as cumprir.”

Por essa razão, organizações como a “Timor Sea Justice Campaign” sabem que é preciso apelar à opinião pública australiana no sentido de pressionar o Governo a tomar a ação correta e anunciou protestos que vão decorrer em várias cidades australianas durante a semana que começa a 21 de março. As embaixadas australianas em Jacarta, na Indonésia e em Díli, Timor-Leste, serão igualmente alvos de protesto.

Imagens1 - Graffiti Stencil por Alfe Tutuala. Imagem de domínio público partilhada por Wikimedia.
2 – Mapa: “Todas as reservas de petróleo e gás estão do lado timorense da linha mediana, ou seja, mais perto de Timor-Leste do que da Austrália.”

*Global Voices

NR.Timor Agora agradece a Manuel Ribeiro e à Global Voice a oportunidade de trazer aqui na íntegra o texto que aborda o roubo a Timor-Leste por parte de Austrália, ao estilo da pirataria refinada do capitão James Cook ao serviço da Marinha Real Britânica e de outras potências europeias que colonizaram terras distantes para abusado usufruto das suas riquezas naturais pertencente aos povos invadidos, colonizados, assassinados e escravizados.

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