Macau, China, 07 mar (Lusa) -- O escritor chinês Chan Koonchung diz que o caso dos livreiros de Hong Kong que estiveram desaparecidos ainda não está explicado e "fere muita gente".
"Esse é o problema. Um dos livreiros estava em Hong Kong e foi para a China sem documentos. Porquê? Essa é a grande questão. Não acho que tenha sido respondida. Apesar de ter aparecido na televisão chinesa a dizer às pessoas que tinha ido para a China para colaborar numa investigação, ainda não explicou como é que deixou Hong Kong e isso fere muita gente", disse Chan Koonchung, em entrevista à Lusa em Macau, onde está para participar no Festival Literário The Script Road.
No final do ano passado, cinco livreiros ligados a uma editora de Hong Kong que publica livros críticos do regime de Pequim desapareceram sem deixar rasto durante meses.
"As pessoas de Hong Kong vão acalmar-se e esquecer-se do caso, mas nunca vão comprar a história que a China lhes quer vender", defendeu Chan Koonchung.
O seu primeiro romance sobre a China -- "The Fat Years" (publicado por uma editora no Brasil sob o título "Os Anos de Fartura") -- desapareceu da Internet em meses sem nunca ter chegado a ser publicado no país -- apenas em Hong Kong e Taiwan --, mas Chan Koonchung continua a viver em Pequim e a escrever sobre política.
"Alguns escritores tentam fazer 'blackout' sobre tudo o que é política. Escrevem sobre outras coisas, mas isso é outra forma de fuga. Se escreves um romance, um romance sério, sobre a China contemporânea vais ter sempre de tocar nos assuntos políticos", disse à agência Lusa.
O seu primeiro livro sobre a China fala de um país que vive na prosperidade económica, mas ao mesmo tempo numa sinistra amnésia coletiva, em que o governo conseguiu eliminar os seus opositores.
"Muitos editores [na China] vieram ter comigo e eu pedi-lhes para lerem o livro primeiro. Eles nunca voltaram. O livro não era publicável na China", disse Chan Koonchung.
No entanto, cópias do livro circularam na Internet durante algum tempo. "Eu não as coloquei na Internet, alguém o fez. (...) Além disso, cópias do livro em papel dos editores de Hong Kong e de Taiwan estavam disponíveis no 'site' em chinês do eBay [portal de vendas por leilão na Internet] e de repente foram obrigados a retirá-lo", adiantou.
"Foi banido nesse sentido, mas nunca ninguém deu uma ordem explícita. As autoridades nunca vieram ter comigo por causa dos meus livros", sublinhou.
Nascido em Xangai, o escritor e ambientalista cresceu em Hong Kong -- onde foi jornalista e esteve ligado à indústria cinematográfica -- e depois de uma passagem de três anos pela capital chinesa no início dos anos 1990, passou outros seis em Taiwan, que considera "a cidade mais habitável da Grande China".
Em 2000, porém, mudou-se para Pequim e aí continua a residir, mesmo sem conseguir publicar as suas obras no interior da China.
"Eu quero escrever sobre a China e sobre o que está a acontecer. A única forma para mim é estar no interior da China. E Pequim é a cidade onde a maior parte da informação circula de alguma forma", justificou.
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