António Veríssimo, opinião
Para quem está fora de Timor-Leste e assiste aos confrontos políticos entre os dois principais partidos e o presidente da Republica fica receoso da subida de tom das palavras com ataques mútuos que proferem e um temor nos invade com uma frase batida que em português tem enorme significado: “quando o mar bate na rocha quem se lixa é o mexilhão.” O mesmo será dizer que “os cães grandes zangam-se e o povo trama-se”.
Invadem-nos a memória cenas dos anos de 2005/2006. Primeiro o desassossego, as palavras pesadas e acusatórias de uns e outros nos poderes – Xanana PR e Fretilin governo – para depois tudo descambar em violência, num golpe de Estado… e muito mais violência. Ao que parece os eleitos pelos timorenses, incluindo deputados, governo e presidente da República, já se esqueceram disso e das vítimas mortais ou com mais ou menos gravidade que aquela “guerra” causou. Tudo pela posse do poder e o que lhe é afim. Parece que agora, dez anos volvidos, se esqueceram do mal que causaram aos timorenses. Parece que agora, que agora, ressuscitou uma nova “febre” pelo poder. Uma “febre” que pode descambar em violência para que uma vez mais quem se lixe sejam os timorenses, o povo timorense.
A falta de formação democrática dos lideres em “guerra” em Timor-Leste ressalta até aos olhos de um cego com audição naturalmente mais desenvolvida. O timbre, a vozeairia, as acusações espúrias e nefastas que o PR troca com os líderes da Fretilin e do CNRT, e vice-versa, estão a atingir o tom errado e as notas que podem descambar em desgraça para os timorenses na generalidade. Um e outros acabam por constituir-se numa orquestra tétrica que não se pode só medir com uma fita métrica como acabará por requisitar a presença da força, da violência, das armas, dos incêndios, das vítimas conseguidas em corpos e mentes dos inocentes e saturados timorenses com as “guerras”, com os assassinatos, com as agressões por nada, com os descarados roubos e destruições que se têm vindo a somar ao longo de décadas.
Tenham juízo. Vocês não foram eleitos para isto, para dividir, para abandalhar ou roubar a soberania de Timor-Leste que pertence ao povo timorense e a mais ninguém. Cumpram as funções para que vos deram os votos que vos elegeram. Cumpram as promessas, cumpram a Constituição da República de Timor-Leste, preservem a paz, a justiça e o bem-estar dos timorenses como devem. Basta de erros em que são sempre só os timorenses a arcar com os prejuízos.
Nenhum dos intervenientes nesta luta de galos carecas, envelhecidos e tresloucados é pai da Nação Timorense. Quem o é é o povo timorense, mais ninguém.
Atentem e envergonhem-se da vossa “guerra”, dos vossos desentendimentos exacerbados, das vossas ganâncias e soberanias bacocas. Presidam e governem com dignidade a República de Timor-Leste. É para isso, só para isso, que os timorenses vos mandataram através do voto. É só esse o vosso poder legítimo até ao fim dos mandatos.
Que os vossos deuses vos dêem um bafejo de paz, de sabedoria, de honestidade, de humildade, de ponderação, e vos sente à roda de uma mesa para dialogarem sem sofismas. Os timorenses agradecem. É o que querem para terem paz, liberdade, justiça, progresso e democracia, sempre.