Díli, 12 dez (Lusa) - Tiago Guerra, cidadão português retido em Díli desde outubro de 2014, e a mulher, Chan Fong Fong Guerra, receberam hoje no aeroporto de Díli os dois filhos, que já não viam há 14 meses, num encontro de grande emoção.
Os filhos do casal, Tomás e Matias, de 11 e 9 anos, chegaram hoje de Portugal acompanhados pela avó paterna para passar o natal em Díli de onde os pais não podem sair e onde Tiago Guerra cumpriu oito meses de prisão preventiva, entre outubro de 2014 e junho de 2015.
Ainda sem acusação formada, o casal continua com a documentação confiscada, contas congeladas e impedido de sair de Timor-Leste, vivendo com a ajuda de familiares e amigos.
Não se conseguiram despedir dos filhos quando em outubro, primeiro Tiago e depois Chan Fong Fong, foram detidos em Díli, tendo as crianças sido retiradas do país pelos avós, que estavam na altura em Timor-Leste.
"Neste momento é tudo muito confuso. Estou muito contente neste momento de poder abraçar os meus filhos. Mas ainda muito ansioso", disse à Lusa Tiago Guerra, emocionado com o reencontro com os filhos.
"Não temos ideia se e quando vai haver uma acusação ou quando poderá haver qualquer evolução no processo. Estamos a falar de 14 meses e a única evolução foi o Tribunal de Recurso reconhecer algumas das coisas que tínhamos alegado", disse.
A família reencontrou-se hoje na sala VIP do aeroporto de Díli para onde os filhos e a avó foram encaminhados pela intervenção do ex-Presidente da República José Ramos-Horta, que viajava no mesmo voo.
"É com muita alegria que vejo os pais reunir-se com as crianças. Acompanho este processo há mais de um ano. Conheço o senhor Tiago Guerra há muito tempo. É uma pessoa honesta que sempre trabalhou para ajudar Timor-Leste", disse Ramos-Horta à Lusa.
"Nesse sentido preocupo-me com este caso, especialmente quando envolve crianças traumatizadas por estas situações. Espero que a Procuradoria-geral da República e os tribunais façam o que têm que fazer com alguma celeridade para se chegar a uma conclusão deste caso".
Tiago Guerra está indiciado "pela prática em autoria material de crime de branqueamento de capitais" sendo que várias decisões tomadas no decurso da investigação, que ainda decorre, nunca foram comunicadas ao casal.
É o caso do congelamento de contas em Timor-Leste, Macau e Portugal de que o casal só teve conhecimento quando houve problemas com o pagamento de uma hipoteca.
"Mesmo a vinda dos meus filhos agora foi com a ajuda de amigos e família. E temos a sorte de poder ter este luxo nesta situação. Uma família estar junta não deveria ser um luxo, é uma questão de direitos humanos, mas a verdade é que é um luxo", disse.
Chan Fong Fong, que nos últimos 14 meses tem sido mãe à distância, conversando com os filhos apenas pela internet, diz que "tem sido difícil" estar "tão longe deles" durante tanto tempo.
Depois de cumprir prisão preventiva durante oito meses na cadeia de Becora, em Díli, Tiago Guerra viu o Tribunal de Recurso alterar a sua medida de coação, aplicando-lhe Termo de Identidade e Residência com impossibilidade de saída do país.
No acórdão em que alterou a medida de coação, o Tribunal de Recurso considera que foram cometidas irregularidades que prejudicaram a defesa do arguido.
Em particular, sublinha o texto a que a agência Lusa teve acesso, porque na decisão sobre a renovação da prisão preventiva, aplicada em abril (cumpridos os primeiro seis meses de prisão preventiva) foram ignoradas provas apresentadas pelo arguido.
O coletivo de juízes considera ter sido cometida uma "irregularidade" que afeta com "grande gravidade" os direitos de defesa do arguido porque o despacho que aplicava a prisão preventiva não ponderou as questões de facto e de direito alegadas pelo arguido, omitindo assim "por completo, o dever de fundamentação".
"Nenhuma das provas apresentadas pelo arguido foi tida em consideração ou analisada pelo juiz", nota, pelo que tem que ser o Recurso "para suprir oficiosamente a irregularidade verificada", pronunciar-se sobre a pretendida renovação da prisão preventiva e a sua substituição por outra medida de coação.
O caso do Tiago Guerra gerou uma onda de solidariedade nas redes sociais, com uma campanha de sensibilização levada a cabo por familiares e amigos e que suscitou várias ações diplomáticas e políticas em Timor-Leste e Portugal.
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