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QUEM SOFRE COM A POLÍTICA CLIMÁTICA NA AUSTRÁLIA?

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A Austrália tem por meta reduzir, até 2030, as emissões de gases-estufa entre 26% e 28%, em relação aos níveis de 2005, mas a mineração de carvão pode impedir sua realização.

Neena Bhandari, da IPS – Envolverde

Sidney, Austrália – Seus muitos anos de experiência como guarda florestal na Austrália permitem a Rowan Foley calibrar as consequências que as altas temperaturas e os fenômenos meteorológicos extremos têm sobre a população que vive nas zonas mais quentes do país.

“Os incêndios são mais frequentes e a intrusão de água salgada gera menos água doce”, explicou Foley, que trabalha no Parque Nacional Uluru-Kata Tjuta, no Território do Norte, e pertence ao clã Wondunna, do povo badtjala. Essa situação “afeta os proprietários tradicionais indígenas da terra, que são os que contribuem menos para o aquecimento global”, afirmou à IPS.

A Austrália é o mais árido dos continentes habitados (geologicamente assim considerada por se encontrar sobre sua própria placa tectônica), e é provável que experimente mais consequências adversas causadas pelo aquecimento do planeta do que o resto do mundo. Secas, inundações, ondas de calor e incêndios florestais já afetam o ambiente e a economia do país, prejudicando ainda mais a população indígena e os mais vulneráveis que vivem em localidades remotas e insulares.

“As Ilhas Cocos, no estreito de Torres, sofrem a ameaça da elevação do nível do mar. A cultura e o patrimônio da população indígena estão ligados à ilha e não teriam para onde ir. Também vemos aumentos nas mortes relacionadas com o calor”, detalhou Kellie Caught, diretora de mudança climática do Fundo Mundial para a Natureza Austrália.

As mortes pelo calor duplicarão nos próximos 40 anos nas cidades australianas, e o nível do mar continuará subindo este século, mais rapidamente do que em 40 anos anteriores, segundo a organização independente Climate Council. Para apoiar o desenvolvimento sustentável das terras indígenas mediante a combinação das práticas tradicionais e as necessidades empresariais, Foley implantou o Fundo de Carbono Aborígine, uma empresa sem fins lucrativos, em colaboração com a Caritas Austrália, há cinco anos.

Por milhares de anos, os povos indígenas administraram a terra nas regiões de savana do norte tropical australiano, provocando pequenos incêndios no inverno. Isso evita que o fogo sem controle destrua a terra e também reduza a quantidade de dióxido de carbono produzida pelos incêndios florestais na atmosfera.

O Fundo criou um programa pelo qual os produtores realizam a agricultura de carbono, o que lhes permite obter créditos de carbono mediante a redução das emissões de gases-estufa, ou capturar o carbono na vegetação e nos solos. Esses créditos são vendidos a organizações e empresas que desejam compensar suas próprias emissões, e o pagamento por eles ajuda a criar meios de vida sustentáveis em comunidades remotas.

“A agricultura de carbono é uma agroindústria e necessitamos com urgência de um pacto de desenvolvimento para apoiar essa indústria”, destacou Foley, diretor-geral do Fundo. Organizações da sociedade civil asseguram que, por ser um dos países mais ensolarados e com ventos do mundo, a Austrália tem enorme potencial para a energia solar e eólica.

Mas o governo de coalizão dos partidos Liberal e Nacional reduziu as metas de energia renovável no país e revogou impostos sobre o dióxido de carbono e a mineração. “Nosso governo chegou ao extremo de revogar ou enfraquecer a política climática e de energia limpa”, apontou à IPS Tom Swann, pesquisador da organização independente The Australia Institute.

“Se a Austrália prosperar em seus planos de duplicar as exportações nos próximos dez anos, o mundo perderá o combate contra a mudança climática. Mais minas de carvão significam preços de carvão inferiores, menos energia renovável e mais impactos climáticos”, acrescentou Swann.

“De fato, o cumprimento da meta (do aumento máximo da temperatura mundial) de dois graus centígrados implica que 95% do carvão da Austrália devem permanecer no solo, mas o primeiro-ministro, Tony Abbott, afirma que não, se ocorrerem “coisas mais prejudiciais para nosso futuro’”, prosseguiu o ativista.

O carvão é a segunda maior exportação da Austrália e este ano as vendas ao exterior vão gerar US$ 253 bilhões, segundo o Departamento de Indústria e Ciência. O país exporta 80% do carvão que extrai e cobre 75% das necessidades de eletricidade do país com a queima desse mineral. “Necessitamos de novas medidas para passar do carvão sujo para a energia renovável, incluindo o compromisso de ter ao menos 50% de energia renovável até 2030”, afirmou à IPS Cassandra Goldie, diretora do independente Conselho Australiano de Serviço Social.

A Austrália tem como meta reduzir até 2030 as emissões de gases-estufa entre 26% e 28%, em relação aos níveis de 2005. Essa meta é, “lamentavelmente, insuficiente e não está coerente com o limite do aquecimento abaixo dos dois graus centígrados. Se todos os países equiparassem seus objetivos com o da Austrália, o mundo estaria se encaminhando para um aquecimento de 3 a 4 graus”, afirmou Caught, do WWF.

Os Estados Unidos e a União Europeia reduzirão suas emissões em aproximadamente 2,8% ao ano, enquanto a proposta australiana equivale a uma redução de 1,8%, segundo o Instituto de Recursos Mundiais.

Grupos ambientalistas argumentam que a Austrália pode se transformar em uma economia de baixas emissões de carbono. “Estima-se que a meta projetada pelo governo para 2030 reduzirá o crescimento do produto interno bruto (PIB) entre 0,2% e 0,3% nos próximos 15 anos”, pontuou Caught à IPS. “Com uma meta de 45%, o crescimento somente diminuiria de 0,5% a 0,7% no mesmo período. Nosso PIB compensaria essa pequena diferença em apenas alguns meses”, acrescentou.

A preocupação das organizações civis é que o aumento do nível do mar afete especialmente os que sofrem pobreza e desigualdade, ao inundar as zonas costeiras, reduzindo o rendimento dos cultivos e obrigando à migração milhões de pessoas que terão menor capacidade de adaptação.

“A meta da Austrália não reflete nenhum reconhecimento de que nossos povos indígenas e vizinhos insulares do Pacífico já estão sentindo as consequências, nem o senso de urgência que invade muitas dessas comunidades”, segundo Negaya Chorley, da Caritas Austrália. “Diante dessa negação, nosso governo não está nada preparado para acolher e apoiar comunidades inteiras que sejam obrigadas a emigrar devido ao impacto da mudança climática”, acrescentou.

A Austrália gera 26,6 toneladas de emissões por habitantes equivalentes de dióxido de carbono e contribui com 1,3% das emissões do planeta, segundo dados de 2011 do WRI, embora tenha uma população relativamente pequena, de 23,8 milhões de pessoas. Envolverde/IPS

Postado em: Inter Press Service

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